Sunday, November 28, 2010

Chaleira elétrica

Quem já não queimou um "Rabo quente" ligando ele na tomada, antes de colocar a coisa dentro da água, que seja honesto e assuma que era do tipo que fazia absolutamente nada, quando acampar seria melhor do que ficar num confortável hotel. Rachar a gasolina, acordar com as formigas, tropeçar nas cordinhas das outras barracas, dividir banheiro, minha juventude foi linda. Os ingleses sempre precisaram de muita água quente pra fazer os chás deles, usar gás pra esquentar água não parecia ser a maneira mais rápida e econômica então, faz muitos anos, inventaram um rabo quente que vem dentro de uma chaleira. Chamam de kettle. Já é possível comprar uma kettle no Brasil, não preciso mais ocupar espaço da minha mala, quando em férias, levando as tão corriqueiras chaleiras elétricas de presente. As kettles fazem parte da cultura inglesa, e colocam somente água pra esquentar. Lembrei de uma vez que uma amiga de alguém, usou a "primitiva maneira de esquentar água em barracas" pra fazer um nescauzinho matutino, o bichinho tava com fome, faz mais de trinta anos e ainda não perdoei a criatura.

Thursday, November 25, 2010

Jewellery

A casa Masson, foi a joalheria mais confiável da cidade que nasci. Fiquei todo orgulhoso de poder ter comprado, naquele estabelecimento comercial, uns trecos de ouro pra uma namorada, antes da empresa fechar as portas. Muitos anos mais tarde, já em Londres, na esquina de onde morava, pude ver uma imensa loja Maçon, muito maior do que a que vendia anéis, brincos e espelhinhos em geral. Na verdade, demorei pra descobrir o que o imponente prédio fazia na esquina, do que se alimentava, pra que existia. Meu inglês deu uma melhorada, e descobri que existiriam jóias de pessoas dentro, pelo menos esta seria a fantasia deles. Na vida, tive o desprazer de tentar conversar com dois, não responderam a nenhuma pergunta que fiz, com os requintes que o sadismo permite. A loja Maçonenta da esquina, é a "catedral" na Inglaterra. Que os Maçonautas perdoem minha blasfêmia, e que me permitam dizer que o tio Nietzsche influenciou, o quanto pode, a religião, seita, ou a ovelhenta coisa que a filosofia egocentrada deseja ser. Escrevi o que penso, nenhum Maçon terá como me contrariar, faz parte da divina superioridade intelectual deles, eu humildemente entendo.

Monday, November 22, 2010

O Grande Fedor

A história de Londres tem passagens mal cheirosas, nenhuma tão literal quanto a do Great Stink. O problema começou nos anos 1840, quando as modernudas, descargas dos vasos sanitários começaram a funcionar no centro da cidade. Ingenuamente, trataram esse tipo de esgoto como o inocente pluvial, e usavam os mesmos canos que levavam a água da chuva para o coitado do rio Tâmisa. A cólera apareceu, matou milhares de londrinos por dezoito anos, até que aconteceu o verão de 1858. Foi um verão de temperaturas mais elevadas que o normal então, toda a podridão do Tâmisa se fez presente no ar que os membros do parlamento respiravam. Resultado: aprovaram, em tempo record, verbas para a construção de uma via especial para este tipo de esgoto, uma central de tratamento, e deram mais atenção aos entendidos que imploravam alguma solução para o problema, que julgavam ser a causa das mortes frequentes. Os túneis, e a usina de tratamento cloacal funcionam até hoje. O povo não teria como fazer nenhum tipo de protesto, a coisa foi resolvida, porque ardeu nos narizes dos, nem sempre perfumados, parlamentares.

Monday, November 15, 2010

Dona Virginia

Depois que descobri que as placas redondas são comuns, fico sempre procurando alguma. Elas me fazem dar uma viajada no tempo e imaginar como seria a vida das pessoas com os nomes gravados nelas, e que viveram na mesma cidade que me adotou. Achei uma dessas placas bem pertinho de onde moro, foi onde Virginia morou, depois que Bernard Shaw foi pra outro lugar. Os caras escreviam à mão, meio na penumbra, o fog londrino ainda existia, imagino que tiravam as ideias do além, e este além era numa casa parecida com a minha, que fica tão perto, e ao mesmo tempo completamente longe. Tento, tento, e não consigo entender. Na verdade, sou mais fã de Leonard Woolf, que conseguiu ficar casado com a dona Virginia, enquanto ela pôde permanecer viva.


Saturday, November 13, 2010

Aposentadoria

Ela já tava meio frágil, então agora, colocaram a maleta que carregava o discurso dos planos anuais dos ministros da economia britânica num museu, depois de150 anos. Apenas dois empedernidos acharam melhor mandar alguém comprar uma maleta nova, para abrigar os seus maravilhosos discursos, e que resultaram nos poucos seis anos de folga da valise vermelha. Ela também é chamada de maleta Gladstone, porque foi feita pra ele lá por 1860, o cara foi ministro da economia por três, e Primeiro-ministro por quatro mandatos. Churchill usou a maleta Gladstone quando foi ministro dos dinheiros britânicos. O museu escolhido, foi onde funcionou o governo enquanto a II guerra durou, achei perfeito. Tenho certeza que o jovem Winston sentia orgulho de carregar aquela maleta vermelha, longe de ser nova, mesmo em 1924.

Friday, November 12, 2010

Os canos

Quando o avião estava quase aterrissando, pude ver Londres pela primeira vez. Não consegui avistar nenhum castelo medieval, ou nada que me desse a menor referência do que imaginava ser a cidade. Pude avistar a falta de planejamento das ruas, e umas edificações parelhas, geminadas, achei estranho. Agora em terra firme, já faz anos, sei o que vi lá dos ares. A grande maioria das casas londrinas, são o resultado de uma tentativa, com algum sucesso, da Rainha Victoria de dar melhores condições de moradia aos súditos. Como na época, água encanada deveria ser sonho de consumo geral, os prédios ostentam os canos de tudo ao ar livre. Nasci numa cidade lá do sul do Brasil, e talvez por isso, me incomode poder imaginar onde o banheiro das casas, ou dos apartamentos ficam. Já tomo chá com leite, mas nem por isso concorde com essas corriqueiras "intimidades públicas" dos primeiros mundistas.

Tuesday, November 09, 2010

Devaneios

A ideia de morar longe da terrinha que nascemos, pode ser deslumbrante pra quem vai em curtas férias pra algum lugar, e volta correndo pra cidade natal, com saudades de tudo e de todos. Digo isso, porque já fui assim, já pensei assim. De tanto ouvir dos "desgarrados" que a comida do país deles é muito melhor, e tendo o mesmo sentimento, me dei conta de um fator importante, pelo menos pra mim. Comida e saudades são coisas completamente diferentes e ficam misturadas facilmente. Descobri que a jamaicana Cassava é irmã do aipim, que o grego Halloumi é irmão do queijo de coalho, e que os árabes fazem um Catupiri excelente, só o rótulo que é meio complicado de se entender. As descobertas que fiz, me ajudaram a pensar que, nem gosto muito de mandioca, queijo das praias nordestinas, e nem de requeijão. Gosto mesmo e tenho saudades das pessoas que esses apetrechos, um dia, estiveram por perto.

Monday, November 08, 2010

Minhas mews

As mews são ruas estreitinhas, sem calçadas, e que algumas casas tem até garagem. Adoraria morar numa rua mews, acho elas charmosas. Meus dinheiros, ainda não permitem que eu more num antigo estábulo, as casas são muito caras. Como não existe a possibilidade de estacionar o carro na frente da casa, o "plano diretor" permite as garagens, e também, são construções mais adequadas ao século que vivemos. As mews, tem o mesmo nome da rua onde ficam os casarões, com o mews acoplado no nome da rua principal. São nos fundos, as lindas ruelas que os cavalos moravam. Mesmo não tendo calçadas, acho a coisa mais parecida com a maneira de morar americana.

Saturday, November 06, 2010

Paul Landowski

Nesta semana meus "amigos" pegaram no meu pé, sou o responsável pelo Brasil, e piadinhas brotam com facilidade. Os poloneses estão terminando de montar um Cristo Redentor 3 metros mais alto do que o carioca. Vi as fotos da coisa feita à facão. Os polacos não colocaram o cristo deles em cima de um pedestal. Resultado: vai ficar 5 metros mais baixo que o original, mesmo sendo erguido 80 anos depois. A inteligência europeia é uma coisa que me emociona. O parisiense que esculpiu o Cristo Redentor brasileiro, teria vergonha de ver a versão polonesa. Os pais dele eram poloneses, e ele, um escultor.

Friday, November 05, 2010

Sonhos

Recebi minha mesada (crianças deveriam usar capacete?), e comprei meu primeiro Abbey Road, tive dois. Eu tava todo feliz, já podia ir ao centro da cidade sozinho, e era proprietário de um, pra mim, novo disco dos Beatles. Ouvia com fones de ouvido, pra poder abusar do volume, e aproveitar as maravilhas da moderna tecnologia estereofônica. Sempre com a capa na mão, querendo ler o que não estaria escrito nela. Décadas mais tarde, a vida me deu a oportunidade de ver aquela faixa de segurança que tanto sonhei. O fusca branco, mal estacionado, não estava. Não vi George Martin regendo uma orquestra sinfônica executando uma versão de alguma música Beatle que a minha fantasia infantil, esperava. Vi uma rua, e uma faixa de segurança. Andei nela pra ter certeza que nada de mágico aconteceria, e nada aconteceu. Olhei o casarão, que ainda é o estúdio, e pensei, pra eles, o sonho que acabou, era na verdade, um pesadelo. Trabalharam duro, foram submetidos às regras da indústria de discos por uns por 10 anos, cantavam com um sotaque que não era o deles, pra ganhar o que? Fama deve ser uma tortura, os dois que já viajaram, não precisam mais do dinheiro que ganharam. Um dia, poderia fazer mais uma tentativa de agradecer ao John e ao George por tudo que senti ouvindo o talento deles, não acredito na possibilidade, amadureci.

Wednesday, November 03, 2010

Agora é fashion

Não sei pra que as greves de transporte coletivo servem, além de atrapalhar a vida do povo. Hoje, tivemos mais uma dos funcionários do metrô. Greve inglesa tem hora e dia, pra começar e terminar. São tradicionalmente de 24 horas, alguém inventou a regra que é rigorosamente cumprida. A imprensa diz que foi uma maneira de chamarem o prefeito de mentiroso, por conta de umas demissões que foram feitas. O Boris tem bicicleta, e as demissões foram feitas pelo grupo que controla todo o sistema underground (metrô), não entendi nada. Hoje foi um caos. Londres parecia ter o triplo da população, sempre fica uma grande parte enterrada. Quem vive apenas na superfície, nunca vê esta gente. As ruas cheias de carros, ônibus, motos, bicicletas, patinetes, valia tudo. As pessoas todas, com cara de atrasadas, porém seguras da boa desculpa que dariam, quando chegassem tarde nos seus compromissos.

Tuesday, November 02, 2010

Neve

No segundo andar, daqueles vermelhos ônibus velhinhos, numa noite muito fria, olhando por uma das janelinhas, pensando como seria a nova vida, vi a chuva cair de uma maneira mais lenta, meio atravessada, pensei que eu tava sonhando. Tava nevando de verdade, não era sonho. Em minutos, tudo ficou branco, lindo. Pra minha felicidade ser total, faltaria apenas as flores que um diretor de cinema sueco colocou sobre a neve no filme da Fanny. Aquela cena, eu adoraria ver de perto. Era só eu ter umas flores e jogar em um lugar qualquer. Vi o filme com a mulher que me deu dois presentões, e eu amava, assim como amei ver a neve, que depois que para de cair, vira umas lâminas de gelo, difíceis de se conseguir ficar em pé. Depois de algumas chuvas, as ruas, assim como as lembranças, ficam mais seguras pra se andar, sem a gente escorregar.