Wednesday, July 11, 2012

Grande figura

O The Guardian é o único jornal inglês que ainda respeito. Acho que pelo tamanho das folhas, deve ser por isso. O vô tinha um Aero Willys sempre novo, assinatura do Correio do Povo, telefone residencial e casa em Capão da Canoa. Nunca entendi porque uma pessoa com tudo isso, leria as seleções do Reader's Digest. Pior, ele me aconselhava a ler. Eu lia aquela coisa com meio olho, afinal o vô tinha recomendado. Sempre esteve estampado que o editor seria um russo camuflado, criança também é gente, né? Nuns domingos, íamos filar um churrasco convidado. A vó, sentava embaixo das parreiras de uva, e conversava bastante com a tia Angelina fazendo um crochet, sempre com um romancinho de página marcada ao lado. Nunca vi a Emma lendo seleções (acho que ela brigava com o vô, também por isso) a vó era meio de esquerda, acho. Minhas duas avós eram comunistas? Na sala principal tinha sempre um cheiro de tinta e papel novo, que vinham do correião. Eu brincava com uns botões, enquanto meu pai e uns tios disputavam umas páginas. Décadas depois, tive o privilégio de conversar com um cara que fez muito parte da história do jornalão Correio do Povo.  Depois ele virou nome de uma sala de cinema. Grandes pessoas morrem também, simples assim.

Saturday, July 07, 2012

Começo do meu Bom Fim

Quando pude escolher um lugar para morar em Porto Alegre decidi que seria numa ruazinha do Bom Fim. Muitos anos depois, quando tive uma segunda chance, fui parar numa ruela pertinho do famoso bairro londrino Camden Town. O lugar não tem nada de mais, nem de menos. Amy Winehouse circulava sempre, Morrison foi muito, Beatles e Rolling stones devem ter feito shows na enorme coisona redonda que foi um final de linha de trens. Encurtando, nessas ruas, para todas as tribos atuais ou passadas sempre esteve a venda todos os uniformes e enfeites necessários para que uns jovens pareçam idiotas assumidos. Acho triste ver umas pessoas todas furadas por piercings, corpo tatuado, vestindo uniformes e se acharem superiores. Tadinhos. Voltando a minha ruazinha do Bom fim, que saudades. O apartamento era meio novo, pude transformar a cozinha em laboratório fotográfico. Saia correndo do meu trabalho para ficar estendido numa cadeira barata de praia lendo. Só abandonava o posto depois de mais um livro lido ou capítulo terminado. Eu era novinho, tinha uma vida interminável pela frente. Quando dava uma fome muito grande, saia de casa para comer um X.  Tinha muitos lugares que o X era legal, mas tinha um na minha rua que era especial. Não lembro do nome, que pena! Tinha uma coisa de cinema que eu adorava também. O Bristol era um cineminha acoplado ao Grande cine Baltimore, que passava uns ciclos. Fui camondongo do Bristol. Quando pude, fiquei na ultima fileira, bem no meio dela, o barulho do projetor era grande, nos contudos, pude ver um filmes bem bons numa posicao gratuitamente privilegiada. O Bristol, por um bom tempo, foi o meu descanso, minha paz. 

Tuesday, July 03, 2012

Meus pais

Talvez a falta de sol esteja me fazendo mal, tenho quase certeza. Li uma coletânea de maluquices e esquisitices sobre uns escritores ídolos meus. Porque alguém se daria ao trabalho de juntar informações e escrever um longo texto com coisas sem comprovações ou importância? Povo seria povo, faríamos parte dele ou sempre faremos. Nunca me importei com a vida de quem me levou para passear pelo mundo das frases, somente aproveitei. Fui um adolescente perdidão, uns ídolos me educaram, outros fizeram acreditar que nunca saberei merda nenhuma. Tenho inveja de quem acha que sabe alguma coisa, e como tenho. Vim para Londres com uma mão na frente e a outra tapando a bunda. Uma única virtude nunca deixei escapar, diriam ser o tal de bom senso. Se meus ídolos escreviam em pé, acreditavam em horóscopo, colecionavam coisas, eram calados, tomavam todas ou se drogavam, não me interessa. Não convivi com eles, apenas tive a sorte de ser educado por umas linhas muito bem escritas. 

Sunday, July 01, 2012

Promessa

Estava eu ontem de shorts, camiseta e havaianas vendo um jogo de tênis. As cervejas bem geladas e eu compenetrado na televisão. Eis que a mulherada começou a chegar, uma de um parque e a outra de algum stress. Acharam o meu programa de sábado muito chato e começaram a bocejar. Me dei conta, desisti da minha programação e disse que iria me vestir para sairmos de casa. Detalhe importante, ainda tive que prometer que seria dócil com os garçons/etes, mesmo aqueles que "roubariam" coisas da mesa sem a nossa autorização e os que serviriam coisas geladas e ainda defenderiam os cozinheiros. Devidamente fardado, me sentei no banco traseiro do carro inventando um mantra daquelas coisas ridículas de auto-ajuda: Não vou brigar com ninguém, não vou ser grosseiro, não reclamarei de nada, aceitarei tudo na santa paz. As meninas acharam divertida a minha brincadeira e rimos bastante. Achamos uma mesa de um restaurante escolhido e ainda lendo um difícil cardápio, um garçom chega. Ele pegou o rococó dos guardanapos de algodão que estavam sobre a mesa e colocou nos nossos colos. As duas me olharam imediatamente, devem ter pensado: Xi, o velho rabugento vai ser deselegante de novo. Não fui, agradeci o cobertor não precisado e segui tentando entender o cardápio. Foi outro sabado quentinho. O: Tu me prometeu pai, não lembro se já descumpri. Acho que ainda não, e espero que nunca.